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- LENÇOS COMEMORATIVOS

A estampagem em alguns lenços é algo extraordinário. Reconhecemos como lenços comemorativos ou especiais, aqueles que tiveram emprego restrito, e portanto, não tiveram um amplo uso social coletivo. Eram adquiridos por poucas pessoas, normalmente envolvidas com o ato a ser memorado e geralmente de boas posses, dado ao encontro de raríssimas peças em museus ou acervos de colecionadores.

Em investigações de acervos históricos privados e públicos chegamos a conhecer pelo menos uma dezenas de lenços especiais, comemorativos e raríssimos, destacando duas passagens importantíssimas na história do Rio Grande do Sul: A Revolução Farroupilha e a Guerra do Paraguai.

Lenço Farroupilha – Barrado Azul. Fonte: Acervo Documenta Costumes - Vera Stédile Zattera - Instituto Memória Histórica e Cultural da UCS

Em diversas leituras, percebemos que a estampagem de lenços não era uma exclusividade dos lenços gaúchos. Conhecemos outras peças, com a mesma intenção comemorativa e memorável, por exemplo, um lenço de bolso comemorando a independência do Brasil. Afora outros artefatos comemorativos também são encontrados em acessórios femininos como leques que eternizam imagens de várias passagens importantes da história do nosso país, como a vinda da Família Real de Dom João VI. Peças de grande valor artístico e evidentemente um costume difundido entre a nobreza, distante do povo campesino.

É importante destacarmos aqui, que o que trazemos a seguir deve ser entendido como registro, talvez, mais como curiosidade, para conhecimento da dinamicidade da simbologia que trouxeram alguns lenços. Não deve-se confundir o que segue como peças da Indumentária Tradicional Gaúcha, pois não eram nada populares, tampouco como aconselhamento de uso nas projeções do tablado.

Lenços Comemorativos da Revolução Farroupilha

Segundo Paixão Côrtes (1978), o Lenço Republicano, que viria a ser chamado também de Lenço Farroupilha, era confeccionado em seda palha (natural e fosca), de formato quadrangular, com medidas de 86cm x 86cm. Das versões encontradas, afirma que a de barrado listrado azul seja importado da França, e a versão com barrado vermelho seria importado dos Estados Unidos da América. Ainda, nos traz a informação de que essa peça teria sido encomendada dois anos antes do final da guerra farrapa, prova disso é que o lenço contém insígnias de vitórias farroupilhas, com registros de datas, feitos, frases poéticas e figuras, com destaque ao Brasão da República Rio-grandense. Ainda, há uma série de símbolos da maçonaria, o que comprova a participação deste grupo nos feitos da revolução.

Como sabemos, sua tiragem foi especial, importada, e portanto, acreditamos terem sido adquiridos por veteranos dessa campanha revolucionária e ainda da maçonaria rio-grandense, intimamente envolvida com os ideais revolucionários. Para quem queira saber mais dessa peça aconselhamos a leitura na íntegra do estudo com minuciosos detalhes dessa peça, deixado por Paixão Côrtes em O Gaúcho – Danças, Trajes e Artesanato (1978)

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Segundo Augusto Meyer, citando Apolinário Porto Alegre, os primeiros lenços que foram encomendados dos E.U.A. não chegaram a ser usados pelos farroupilhas, pois foram queimados no porto de Rio Grande. Os que vieram por terra, pelo solo uruguaio, tiveram seu destino certo, chegando aqui em 1843. (CÔRTES, 1978, p. 186)

Lenço Farroupilha – Barrado Vermelho. Fonte: Acervo Museu Júlio de Castilhos. Porto Alegre/RS.
Lenço Farroupilha – Barrado Azul. Fonte: Acervo Documenta Costumes - Vera Stédile Zattera - Instituto Memória Histórica e Cultural da UCS
Lenço Farroupilha – Barrado Azul(?) Fonte: Acervo Museu Júlio de Castilhos. Porto Alegre/RS

Encontramos no Museu Júlio de Castilhos um lenço com as mesmas medidas, material e informações do lenço com barrado vermelho, no entanto, no lugar da cor clara (um tipo de amarelo) que meia e circula a peça, está uma cor que remete à um azulão. É o único exemplar que conhecemos. Antônio Augusto Fagundes já havia percebido este lenço que sugere ter sido pintado por cima, ou então uma peça sem o devido registro histórico. O mesmo autor faz preciosa contribuição especial na luxuosa obra: Gaúcho Vestuário Tradicional e Costumes (1997) da pesquisadora Vera S. Záttera.

Lenços Comemorativos da Guerra do Paraguai

Sobre os lenços que seguem, podemos correlacioná-los a Guerra do Paraguai, pelas datas, vultos históricos neles estampados e descritivos encontrados nos acervos  pesquisados. O fato é que eles existem, são raríssimos e nos dão ideia de quão interessante é o fato de se comemorar datas importantes em peças icônicas como essas que seguem.

Importante também, é destacar que, trazemos aqui, apenas uma breve introdução ao estudo desses lenços, devido à ausência de informações mais precisas sobre seu uso ou não. Esperamos que melhores estudos, possam nos trazer, um pouco mais sobre essas peças, que acreditamos serem adquiridas - como os demais lenços comemorativos - por pouca gente, de bons recursos e provavelmente envolvidas com os atos a serem memorados. Evidentemente, não eram peças populares e tampouco tradicionais. Parecem-nos, inclusive, pela ausência de imagens que denotem seu uso, que mais se aproximam de suvenires do que de peças usadas na vestimenta antiga.

Conde D’Eu, Dom Pedro II e o Duque de Saxe, vestindo ponchos gaúchos para a vistoria das tropas na Guerra do Paraguai. Uruguaiana 1865.
Lenço comemorativo da Guerra do Paraguai. Fonte: Onze Dinheiros Antiguidades

Lenço 1 da Guerra do Paraguai

Segundo o site de antiguidades Onze Dinheiros:

“Raríssimo Lenço comemorativo da Guerra do Paraguai, feito em seda palha, tendo ao centro Sua Majestade Imperial D. Pedro II, Sua Alteza Real Duque de Saxe, Almirante da Armada Brasileira, Sua Alteza Real Conde D’Eu, Marechal do Exército Brasileiro, Sua Excelência Almirante Visconde de Tamandaré e Sua Excelência Marechal Marques de Caxias. Borda ricamente decorada com brasões do Império”

Lenço 2 da Guerra do Paraguai

Neste outro lenço, de algodão (medindo 71cm x 76,5cm) , do acervo do Museu Júlio de Castilhos de Porto Alegre RS, aparecem os bustos de personalidades militares e políticas envolvidas na Guerra do Paraguai.

Ao centro: Jose Maria da Silva Paranhos – Visconde de Rio Branco (1819-1880) e Francisco Octaviano de Almeida Roza (1825-1889). Nos cantos, José Antônio Saraiva (1823-1895), Manuel Marques de Sousa - Visconde de Porto Alegre (1804-1875), Polidoro da Fonseca Quintanilha Jordão – Visconde de Santa Teresa (1802-1879) e Manuel Luís Osório – Marquês do Herval (1808-1879). Todas essas personalidades, envolvidas na Guerra do Paraguai são evidenciadas junto aos brasões do Império Brasileiro.

Lenço com Vultos Históricos. Fonte: Museu Júlio de Castilhos. Porto Alegre/RS.
Lenço com Vultos Históricos. Fonte: Museu Júlio de Castilhos. Porto Alegre/RS.

Lenço Comemorativo - Duque de Caxias

Lenço comemorativo ao Duque de Caxias exposto no Museu Histórico Nacional – Rio de Janeiro/RJ
Lenço comemorativo ao Duque de Caxias exposto no Museu Histórico Nacional – Rio de Janeiro/RJ

Segundo o que consta no descritivo do Museu Histórico Nacional no Rio de Janeiro, este lenço é do séc. XIX, feito em algodão.

“Comemorativo da ação militar do Marechal do Exército Luis Alves de Lima (Rio de Janeiro, RJ, 1808-1880), Duque de Caxias, que durante o Império atuou como comandante das tropas governamentais em conflitos internos e externos, além de ter exercido funções políticas”. (MHN – RJ.)

O Acervo da Academia Militar das Agulhas Negras, traz as seguintes informações sobre este lenço:

“Lenço comemorativo da elevação à Duque de Luís Alves de Lima e Silva. Pertenceu ao Duque e fora ofertado ao Museu da AMAN pelo seu trineto Sr. Adalberto de Queiroz Carneiro da Silva. Ao centro a representação do rosto de Caxias sobre a data comemorativa de sua elevação à duque, 25 de março de 1869, ladeado dos teatros de operações, batalhas e combates que operou o futuro patrono do Exército Brasileiro. Ornando nas laterais as principais datas que marcaram sua vida de soldado e estadista, seus títulos nobiliárquicos e as principais condecorações recebidas.”

Ainda, nos descritivos do acervo encontra-se a data da peça sendo de 1869 e suas medidas: 75x68 cm.

Textos: Giovani Primieri | Fotos: Lidiane Hein | Diagramação: Lucas Negri
Fonte: PRIMIERI, Giovani. Indumentária Gaúcha - dos Bailes Antigos aos Tablados. Porto Alegre: Martins Livreiro-Editora, 2022.

Tem alguma dúvida a respeito do lenço na indumentária gaúcha? Deixe abaixo nos comentários que iremos responder.

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