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A BOMBACHA

A bombacha, é a peça mais icônica da indumentária gaúcha, já bem mais fixada na iconografia de inúmeras regiões não só do Rio Grande do Sul, mas em toda a sul-brasileira e sul-americana, nas antigas fotografias dos nossos avoengos.

Sobre a sua história, existem estudos de diversos pesquisadores, trazendo várias hipóteses. Acolhemos dentre tantos, o que traz Paixão Côrtes (1978). Eis uma explicação bastante simplista: as primeiras bombachas usadas aqui, foram compradas da França, como sobras de fardamento depois da Guerra da Crimeia, sendo adotadas como fardamento militar de algumas tropas, durante os combates da sangrenta Guerra do Paraguai (1864 – 1870).

Passada a guerra do Paraguai, a peça até então usada no fardamento militar, cai no gosto da gauchada, e, além dos veteranos de guerra, começaram também os civis a copiar e vestir essa calça larga, agora, com as fazendas e cores da época (já usuais em outras roupas), e mais tarde, adquirindo aspectos regionais e decorativos diversos, alguns se tornaram tradicionais, outros, nem tanto.

Capatazes da região de Jaguarão RS. Princípios do Século XX. Fonte: Lauro Dieckmann, acervo pessoal.

Sobre a origem dessa peça e toda a história da sua usabilidade no contexto universal ou mesmo regional de outras terras é assunto de estudos específicos, mais aprofundados. Quem quiser saber melhor, vai precisar ler as obras que trazem conteúdos substanciais. Nosso foco aqui é a bombacha já de uso civil, e já tradicionalmente vestida pela gauchada do Rio Grande do Sul.

Paixão Côrtes discorre sobre a bombacha de forma muito minuciosa na obra O Gaúcho – Danças Trajes Artesanato (1978) em duas partes, sendo a primeira em Trajes (p. 147 – 163), onde explica a história e usos da peça, e a segunda em Artesanato – Adornos Artesanais das Bombachas (p. 364 – 372). O conhecimento desses textos é fundamental para a melhor compreensão do que explanamos aqui de forma condensada.

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O uso da bombacha com adornos, podemos,  Entretanto, focalizar áreas onde são mais  expressivas essas características, tais como o Alto Uruguai, o Planalto Médio, os Campos de Cima da Serra, a Depressão Central, a Encosta Inferior da Serra, o Litoral, etc. No gaúcho da fronteira com o Uruguai e Argentina, a bombacha é comumente lisa. (CÔRTES, 1978, p. 367)

Funcionalidades

Por ser larga, aplica-se total funcionalidade ao ato de cavalgar, seja pelo fundilho maior (gancho ou cavalo) comparado a calça, seja pela largura nas pernas que facilita o cavaleiro a montar e “reger” seu pingo com as pernas (destros cavaleiros gaúchos sabiam comandar seus cavalos sem o uso das rédeas, para com os braços pelearem, inclusive, os próprios cavalos eram ensinados a lutar pela própria vida, coiceando e mordendo).

As funcionalidades da peça não foram pensadas para o gaúcho, afinal tal peça não foi criada nos pampas, mas, de qualquer forma, lhe caiu bem sua importação e uso, a ponto de usarmos até os dias de hoje como funcional peça das lides campeiras.

Tecidos

De algodão, linho ou lã. O tecido mais usado foi o brim. O merinó foi muito apreciado (tipo de lã de boa caída e qualidade). Hoje, usam-se tecidos desses mesmos fios com porcentagens variadas de poliéster (tergalizados) que imitam alguns tecidos antigos. Gabardine, casimiras, oxford, lã fria, algodão de alfaiataria, sarja, diversas mesclas e outros.

De acordo com o clima, pode ser de pano mais fresco como o algodão, o linho ou a lã fria, até as lãs com fio mais espesso, mas ainda, de boa caída, excluindo os grosseiros.

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Foto da Invernada Juvenil do C. F. Celeiro da Tradição de Campos Novos | XXV FECART | 2024

Padrões: liso, risca de giz, listrados e xadrezes discretos, espinha de peixe, mesclados. Cores: imperam as sóbrias, neutras e frias: terrosos, cinza e bege, e ainda o azul e o verde, todas essas em seus variáveis tons, excluso os pastéis; em colônias alemãs o preto era usado; cores diferentes destas eram menos usuais, e, quando usadas, dentro de um bom senso de uso masculino.

O uso de tons claros, médios ou escuros são de gosto pessoal, não encontramos referências a cores de acordo com a idade – até porque sempre foram homens feitos que usavam as bombachas, a gurizada só usou essa peça de forma representativa, após a criação do Movimento Tradicionalista Gaúcho.

Dimensões das peças

É larga, mas há variáveis na largura, somente precisando de um cuidado maior quando pensamos nos extremos (larga ou estreita demais). Dizem vários estudiosos do tema que a bombacha é mais larga na fronteira e mais estreita na serra, sobre isso, nos atentamos a dizer que ela continua sendo bombacha (sinônimo de calça larga), então é bom que se deixe claro que essa peça nunca foi apertada, com fundilho de calça simples ou com perna esticada.

Há indubitavelmente um maior emprego de pano que deixará a peça sempre bem folgada.

Corte e Costura

Para um homem de porte médio leva-se em torno de dois metros de tecido enfestado (atualmente 1,5m de largura) incluindo os adornos (favos). Os bolsos apresentam-se nas laterais dianteiras como na calça tradicional, peças mais modernas apresentam bolsos atrás (bem menos usual e quando ocorrem não apresentam lapela).

O cós, tradicionalmente não apresenta passadores de cinta, e os punhos podem variar de tamanho de acordo com o feitio da costureira, gosto do usuário e variações de cortes de bombacha.

Adornos

Preguinhas do tipo toma (horizontal); nervuras; favos (buchinhos, mondonguinhos, casa de abelha); faixa lisa de cor contrastante; botões por cima dessa faixa vertical, ou ainda, dos próprios favos.

É bom lembrar que era comum o uso de bombachas sem favos, maiormente para o uso ordinário, e eventualmente no uso social.

Geralmente são utilizados botões simples para fechar, botões de osso, guampa ou similares para enfeite quando houver. Raramente, alguns gaúchos opulentos usavam botões gauchescos (tipo moeda), no máximo 3 ou 4 por perna;

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“Quando feita para o uso cotidiano, em geral, o nosso homem do campo não usa a bombacha com adornos, mas simplesmente lisa.” (CÔRTES, 1978, p. 367)

Favos

Tradicionalmente do mesmo tecido da peça, com largura média de 3 a 4 dedos (6cm a 8cm), tem início logo após o bolso (parte inferior) terminando um pouco antes do punho. Os favos podem ter como base: pregas simples, pregas macho e nervuras, sendo comumente puxados por linha da mesma tonalidade, excepcionalmente puxados com linha de cor contrastante (pontos decorativos) formando desenhos diversos (geralmente  geométricos), por vezes com aplicações de botões mas sempre sem exageros.

Podem ser feitos a mão, a máquina, ou pelas duas juntas. Os favos tinham apenas função decorativa, e há uma enormidade de variantes, de acordo com a criatividade das costureiras. Não encontramos informações do costume de se desenhar monogramas ou nomes com esses favos, sendo, geralmente desenhos geométricos ou abstratos.

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Aplicação de botões decorativos

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Segundo Paixão Côrtes, alguns gaúchos abastados chegaram a usar botões gauchescos (tipo moedas) decorando as pernas das bombachas (onde estariam os favos ou sobre eles), sobre faixas do mesmo pano ou não, e, neste caso 3 ou 4 botões em cada perna, sendo que os botões gauchescos nunca foram artefatos de fácil acesso, pois eram importados.

Outra forma de usar botões decorando os favos ou faixas é usando botões pequenos (tipo os de camisaria), de forma mais artesanal, aqueles feitos de chifre ou osso e/ou como projeção, em arremedo a estes. Não encontramos informações sobre o uso de botão de madeira ou madrepérola conforme visto por aí, mas percebemos que esses botões são muito frágeis e de fácil quebradura. Ainda é importante atentar ao fato de que correm pelos tablados o que apelidamos de “bombachas dominó”, em exageradas aplicações, com dezenas de botões em cada perna, formando desenhos que lembram essas peças de jogo.

A aplicação de botões era singela, não encontramos fontes imagéticas que justifiquem tais exageros. De qualquer forma entendemos que podemos classificar os trabalhos decorativos com botões como excepcionalidades no feitio da bombacha.

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Sobre faixas de pano contrastante no lugar dos favos

Algumas era claras, brancas, com uma listra vermelha de cima a baixo da perna, onde hoje corresponde a região dos adornos casa de abelhas etc. Talvez lembrando com esta lista reminiscências das calças de oficiais militares. (CÔRTES, 1978, p. 276)

Bombacha usada por gaúcho de Lagoa Vermelha no início do século XX. Tecido branco, adornado de faixa de tecido azul ao longo da bombacha (em vez dos favos), enfeitada com botões. Fonte: (CÔRTES, 1978).
Bombacha usada por gaúcho de Lagoa Vermelha no início do século XX. Tecido branco, adornado de faixa de tecido azul ao longo da bombacha (em vez dos favos), enfeitada com botões. Fonte: (CÔRTES, 1978).
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Usos e Regionalismos

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Como usar: a bombacha, em momento social, era complementada pelo uso das botas fortes, guaiacas (na fronteira tradicionalmente sobre as faixas de lã), camisa atual, colete e casaco, afora o tradicional lenço ao pescoço (à moda antiga ou atual) e chapéu de pelo/feltro de diversos copados, excluso o alto. A espora, o pala e a faca à cintura eram usuais de acordo com a ocasião e costume.

Regionalidade: segundo Paixão Côrtes (1978), a bombacha sem favo era para o uso cotidiano e também mais popular entre os gaúchos da fronteira (com Uruguai e Argentina), mas não os impede de usá-la em festas.

É comum ouvirmos que a largura da perna da bombacha pode indicar sua regionalidade: Ex.: na fronteira, mais largas que nas missões e, na serra, mais estreitas. Não encontramos nada que comprove tais afirmativas.

A BOMBACHA É SEMPRE LARGA!

Hoje vemos bombachas tão estreitas e com fundilhos comum como das calças atuais que sem um passador de cinto para que o mesmo segure tal peça deixariam partes íntimas aparecendo ao montar num cavalo. Ainda, são visíveis nos feitios das bombacheiras atuais nítida “falta de pano no comprimento” – a bombacha “cai sobre o cano da bota, jamais fica esticada”.

Também outro “erro comum” é a bombacha ir se “estreitado” ao longo da peça. A largura é parelha em toda peça, ela não se “afunila” ao descer da perna. Essas são as chamadas “bombachas funil” de péssimo gosto. Nada melhor do que observar as fotos antigas da gauchada para reproduzir uma bombacha bem gaúcha e não cair nos modismos atuais.

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Invernada Veterana do C. F. Celeiro da Tradição, de Campos Novos | XXV FECART | 2024
Invernada Veterana do C. F. Celeiro da Tradição, de Campos Novos | XXV FECART | 2024

Textos: Giovani Primieri | Fotos: Lidiane Hein | Diagramação: Lucas Negri
Fonte: PRIMIERI, Giovani. Indumentária Gaúcha - dos Bailes Antigos aos Tablados. Porto Alegre: Martins Livreiro-Editora, 2022.

Tem alguma dúvida a respeito do lenço na indumentária gaúcha? Deixe abaixo nos comentários que iremos responder.

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